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sexta-feira, novembro 04, 2005

O dia em que o Brasil esteve aqui 

Diego Corneta

Ontem eu fui ver o filme "O dia em que o Brasil esteve aqui" (de Caíto Ortiz) na Mostra de Cinema de São Paulo. Pedrão Pistão estava comigo. O documentário, feito com sérias restrições orçamentárias, é aparentemente simples. Deixa transparecer toda a falta de recursos: feito com câmera digital de mão (não usam tripé e muito menos grua), edição conservadora, trilha sonora discreta, som ambiente, iluminação natural, etc.

Porém as limitações técnicas do filme casam muito bem com as sérias limitações estruturais do Haiti. A situação do Haiti é muito pior que a situação da Bolívia, país catastrófico em que estive recentemente. Por meio de uma guerra civil, o povo lá acabou de derrubar um ditador – o Aristide – e agora tenta reconduzir seu país à democracia. Se não bastasse isso, a miséria e a pobreza são endêmicas. Agora que Aristide caiu, milícias rivais brigam pelo poder. Mais de 70% da população não tem emprego. O povo está carente, faminto e assustado. Porém, o Haiti tem tradição de luta. Foi o primeiro país da América a abolir a escravidão e tornar-se independente.


Ronaldo em ação contra a "seleção do Haiti

No dia 18 de agosto de 2004, a seleção brasileira foi para lá para fazer um amistoso contra a "seleção" local; que na verdade era um apanhando de atletas amadores. O placar pouco importa, o fato do Brasil passar por lá foi muito mais relevante. Não conseguiria descrever em palavras o amor e a paixão do povo haitiano pela seleção brasileira. É inacreditável! Sabemos que a seleção canarinho é o segundo time do mundo inteiro, até dos Argentinos (sim, pesquisas mostraram que a maioria do povo argentino torceu pelo Brasil na final contra a Alemanha). Mas lá no Haiti, como aqui no Brasil (ou mais), a seleção brasileira é definitivamente o primeiro time.

A ONU sabiamente escolheu o Brasil para liderar as tropas de paz que ajudam o país a reconduzir sua democracia. A função do exército brasileiro lá é louvável e respeitável, assim como foi também no Timor Leste. Os haitianos gostam do Brasil, dos brasileiros; talvez nenhum outro povo pudesse ter tantas afinidades com eles senão o nosso. Nossos craques, em sua maioria negros como os haitianos, são adorados e festejados como deuses. Sem brincadeira, como deuses. Talvez nem saibam ao certo do papel social e simbólico que representam (talvez só o Roque Junior tenha consciência clara disso). Porém, certamente são capazes de sentir à flor da pele a paixão e o fervor do povo haitiano. Se não sabiam, passaram a saber. Certamente foi um dia que eles jamais vão esquecer.


O país parou para festejar a nossa seleção

O país parou, as ruas ficaram lotadas. Houve confusão, festa e histeria. Camisas brasileiras eram mais disputadas que arroz e feijão. Muitos haitianos preferiram saciar suas paixões ao invés de saciar seus estômagos. Um esclarecido jornalista haitiano, entrevistado no documentário, acertou num comentário. Em outras palavras, ele disse mais ou menos assim: O Brasil é uma potência cultural. Nenhum outro povo tem a nossa diversidade étnica, nenhum outro país tem a nossa diversidade musical, culinária, literária, festiva, etc. E nenhum outro país tem a seleção brasileira. Sim, querendo ou não, futebol também faz parte da nossa cultura. Segundo o jornalista, sabendo usar essa cultura, o Brasil torna-se uma potência perigosíssima aos olhos dos países mais poderosos. Pois, ao invés de nos impor por armas e terror, podemos nos impor através da cultura, uma arma tão eficaz quanto. Mas, sobretudo, uma arma pacífica.

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